George Lakey – Viking economics: how the Scandivians got ir right – and how we can too – (Economia dos Vikings: como os escandinavos acertaram, e como nós também podemos) Melville House, London 2017, 303 p. – ISBN 978-1-61219-621-3
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George Lakey – Viking economics: how the Scandivians got ir right – and how we can too – (Economia dos Vikings: como os escandinavos acertaram, e como nós também podemos) Melville House, London 2017, 303 p. – ISBN 978-1-61219-621-3

Autor
Ladislau Dowbor
Tamanho
303 páginas
Editora
Ano

Ladislau Dowbor
Dezembro de 2017

Viking EconomicsHá livros que não inventam grandes voos de teoria econômica, nem debatem se devemos ser ortodoxos ou heterodoxos, como é hoje como os economistas se classificam. Buscam de maneira prosaica o que funciona e em particular como se deu. Até porque nenhuma solução econômica é apenas econômica, os sucessos sempre foram construídos pela construção do espaço político para as soluções.

Ao analisar as economias dos Vikings, Lakey trabalha sobre os mecanismos existentes e não sobre um modelo. O título é divertido, porque os Vikings que aterrorizaram a Europa no fim do primeiro milênio, aventureiros dos mais ousados e violentos, dão hoje um exemplo impressionante de economia robusta, com paz social e pouca desigualdade. Em outros termos, dotaram-se de uma economia como a economia deveria ser: proporcionadora de elevada qualidade de vida. Aqui não há heróis solitários, na linha do lonesome cowboy norte-americano. As pessoas colaboram para viver melhor e isso significa todos viverem melhor, até os imigrantes. Uma economia robusta embasada na ampla inclusão social.

Naturalmente, ao ver descrita uma sociedade assim constituída, pensamos imediatamente, e com razão, que no Brasil pós-golpe estamos fazendo rigorosamente o contrário. Essa é a reação de Goerge Lakey, um americano que vive na Noruega, conhece bem os quatro países que analisa – Noruega, Suécia, Dinamarca e Islândia – e se espanta a que ponto o seu país de origem (EUA) se atola na crescente desigualdade, na competição de todos contra todos e na crescente desorganização política, ao praticar justamente o inverso do que ele hoje presencia nos países escandinavos. Afinal, o que funciona?

Francamente, o Viking Economics é uma belíssima leitura para não economistas, inclusive porque os economistas ou já sabem, ou já estão tão convencidos do contrário: que não vão querer saber. Digamos democraticamente que é um livro para todos e para curar qualquer um de falsos economicismos. O que funciona, afinal, é quando os esforços econômicos se orientam o mais diretamente possível para o bem-estar das famílias.

A facilidade com a qual viramos as costas para os exemplos positivos é impressionante, em particular se a realidade teima em não obedecer aos nossos preconceitos. A lógica seria de que grandes fortunas livres de impostos e empecilhos tenderiam a investir, gerando empregos, produtos e impostos. Na realidade, hoje, os afortunados fazem essencialmente aplicações financeiras, visitam paraísos fiscais e, ao reduzir a capacidade de compra da base da população, travam o principal motor da economia que é o consumo das famílias. Mas continuamos a imaginar desculpas, de que afinal se trata de países pequenos, de que a Noruega é próspera graças ao petróleo (a sua prosperidade e equilíbrio datam de bem antes), e que “são diferentes”. De cabo a rabo do livro, Lakey mostra que esses países não são diferentes e sim batalhadores por equilíbrios, progresso tecnológico e justiça social. E que tiveram de engolir muitos revezes na construção dos caminhos.

Gunnar Myrdal, um Nobel sueco de economia, traçou as grandes linhas:  “Acreditava que era possível definir uma economia igualitária que impediria a pobreza e seria produtiva ao mesmo tempo. A sua teoria encorajou o investimento nas pessoas como um recurso para o crescimento econômico, um pilar que veio a ser chamado de modelo nórdico”.  (68)

Todos os quatro países tiveram, por exemplo, recaídas para a direita, com governos liberais, redução de direitos e marés de especulação financeira. A reação veio com muitas lutas, reconquista do poder e estatização ou forte regulação dos bancos, no sentido das poupanças das famílias e impostos do governo servirem ao desenvolvimento dos respectivos países. Na Noruega, “a regulação voltou a funcionar. A lição para todo o setor financeiro foi claríssima (unmistakable): arrisquem o seu próprio dinheiro, não o dos outros. ” (31) Assim a Noruega se reergueu do colapso financeiro de 1991, pela mão de uma mulher forte e de bom senso, Gro Brundtland.

Com a crise de 2008, “a Dinamarca, Suécia e Noruega encontraram maior facilidade para se reequilibrar porque as suas democracias mais fortes asseguraram que os bancos sejam limpos, transparentes e confiáveis (accountable). Rejeitando a ideologia do livre mercado, haviam amplamente retornado ao que funciona. ” (34) Na Islândia, o governo privatizou plenamente a maioria do sistema bancário. O Wall Street Journal proclamou o país “a maior história de sucesso do mundo”.

Em outubro de 2008 o sistema implodiu, levando à quebra dos sistema financeiro bancário e governamental da Islândia. Os social-democratas retomaram o poder e o controle público do sistema financeiro. Recusaram as políticas de austeridade, optando pelo efeito multiplicador das políticas sociais: “O gasto do governo em saúde e educação tem um elevado efeito multiplicador, e, portanto, ajudaria a economia a se recuperar da quebra e ainda salvar vidas. ” (46)

A regulação dos recursos financeiros do país é evidentemente essencial, pois é dessa regulação que surge a possibilidade de orientar o dinheiro para onde será maís útil. O dinheiro em si, hoje, é apenas sinais magnéticos em computadores. Isso confere, a quem o detém, o poder de migrar para um paraíso fiscal, ampliar a bolha especulativa ou investir no que o país mais precisa: bens e serviços gerados pelas empresas, ou acesso ao consumo coletivo como saúde, educação e cultura gerados pelo sistema público. Neste sentido, o controle do recurso financeiro e a sua legitimidade são essenciais para o funcionamento de uma sociedade.

O livro é muito rico, em seu conjunto, porque analisa de forma descritiva e agradável de leitura como esses países enfrentaram os seus desafios concretos: dos bancos, dos impostos, do acesso universal à saúde, da imigração e assim por diante. É um elenco da chamada solucionática. Tomando a esmo, pontos interessantes, porque não se trata apenas de grandes opções ideológicas, mas de inúmeras medidas práticas que as concretizam:

“Os noruegueses parecem ter chegado ao consenso quanto a um mercado cuidadosamente regulado, pleno emprego, cuidados de saúde gratuítos e universais, educação superior gratuita, e um sistema de transporte público eficiente e barato. ” (72)

“O gabinete do governo sueco eleito em 2014 tem um número igual de homens e mulheres, um fato que não causa estranheza nos países nórdicos, já que a participação das mulheres na liderança se tornou tão comum” (190)

“Salários elevados, impostos elevados e serviços abundantes criam uma econômica produtiva e próspera” (92)

“Políticas de apoio às famílias e a educação vocacional de qualidade importam, ao lado do apoio à requalificação e mudança de carreira” (93)

“Pensaram que um pequeno mercado de ações podia ser útil mas precisa ser regulado para que os seus excessos não o destruam. O setor financeiro permaneceu pequeno, em grande parte de propriedade pública, e o restante com elevado nível de regulação. ” (72)

Uma ótima leitura, prática e teórica ao mesmo tempo, apontando caminhos. Ultrapassando as bobagens de que lá deu certo porque “são diferentes”, temos sim de nos inspirar no que funciona. Inclusive porque o inverso, concentração de renda, desigualdade, financeirização e semelhantes simplesmente não estão dando certo.

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